quinta-feira, 3 de março de 2011

A VOLTA





Condorcet Aranha


      A noite ia alta; as estrelas se derramavam no mar; cada onda era espelhada pelo prateado luar e Arthur, olhando também as folhas das palmeiras que, como ondas, iam e vinham acompanhando a passagem da suave brisa, esperava avistar no horizonte escurecido a imagem de um barco que trouxesse, não os peixes de um pescador fortuito, e sim a sua Jurema.
      Ao lado de Arthur, as companheiras inseparáveis, saudade e esperança, dividiam seus momentos de tristeza e alegria, e a cada onda que chegava à praia, ele somava saudade e subtraía alegria. Sobre as areias brancas seu corpo descansava na incerteza, enquanto nos seus olhos, ora havia o brilho da esperança e ora o brilho do pranto. Porém, nada seria o suficientemente forte para afasta-lo dali porque como as raízes dos coqueiros, o seu amor por Jurema, se aprofundara nas areias.
     Sem saber a razão pela qual ela o abandonara, porque sequer despediu-se e nem mesmo um bilhete deixou, Arthur mantinha viva em seu peito a esperança da volta. Amargando às manhãs com o travesseiro de Jurema ao seu lado, no beiral da janela até o canário que tanto cantava, agora é tristeza e mudo ficou. Ah! Aquela roseira em frente à janela, há mais de três anos não vinga uma rosa sequer. O jardim está seco. As cortinas tão sujas por tanto que as abre em busca de ver, no fim da estrada, ao menos um vulto, que possa manter a sua esperança. Em seu desespero, o grande vazio da partida de Jurema, consome o seu peito, lhe toma as idéias, lhe deixa sem rumo. Por isso pergunta, a todos que passam ao longo da estrada, se viram à princesa dos olhos castanhos, cabelos bem longos mais negros que a noite, de andar tão macio que nem as areias conseguem gravar os seus pés delicados. Apenas o olham, sacodem seus ombros e seguem seus rumos, deixando expressões de rostos surpresos que cravam na alma de Arthur, espadas banhadas no sangue da desconfiança, julgando-o louco, talvez! Não importa o que pensam, quem sabe algum dia alguém lhe responda e diga que Jurema chegou lá na praia de braços abertos, sorriso nos lábios, chamando por ele.
     Por dias e meses, por anos seguidos de espera, Arthur se curvou ao peso da idade e agora, apenas o seu pensamento consegue chegar à beira do mar, as ondas nas rochas de espumas tão brancas, desmancham na praia de sua imaginação.
     A cortina apodreceu e despencou da janela, o canário morreu e a roseira também. O mato cresceu e tomou o jardim, mas não tomou a esperança de Arthur que, debruçado à janela, pergunta a todos que passam se viram a princesa de olhos castanhos, cabelos bem longos mais negros que a noite, de andar tão macio que nem as areias conseguem gravar os seus pés delicados. E todos respondem: Não vi seu Arthur! Porém se a vir lhe trago a princesa de volta. Arthur agradece, seus olhos brilham, uma lágrima escorre por suas rugas e se perde, mas ele não perde a esperança de que Jurema voltará. À noite, deita em sua cama e fica acariciando a areia da praia que colocou numa caixa de madeira à sua cabeceira, quando ainda podia andar, até que o sono lhe arrebate.
     O tempo não para, castiga ao Arthur que agora nem pode chegar à janela e, abraçado ao travesseiro de Jurema, pergunta se viram a princesa de olhos castanhos, cabelos bem longos mais negros que a noite, de andar tão macio que nem as areias conseguem gravar os seus pés delicados. Apenas Judith, que cuida de Arthur, lhe responde: Disseram que a viram chegando na praia e logo virá para vê-lo. 
     Arthur não responde, somente uma lágrima escorre nas rugas e some na cama.
     Ciente de que Arthur terá pouco tempo, Judith localiza Jurema e conta-lhe toda a sua vida. Também consumida pelo tempo, Jurema resolve ir até Arthur para conforta-lo. Ao chegar em sua casa, relembra o jardim agora tomado pelo mato, não há mais roseira e nem cortina na janela, tudo se foi. Mas, ela pensa, ainda resta a esperança em sua alma e minha presença lhe trará a tranqüilidade que precisa neste momento. Chega até a cabeceira da cama, coloca-se à frente de Arthur e diz-lhe: Arthur! Sou eu, Jurema, voltei!
     Olhando-a com indignação, ele responde: Por favor, tire os sapatos e pise na caixa de areia. Sem entender o que ele queria, Jurema resolve fazer sua vontade.
Pronto, pode sair. Olhou na areia e viu as pegadas profundas de Jurema, voltou seu olhar para ela e repreendeu-a: Sua impostora, eu vou ao encontro da minha princesa de olhos castanhos, cabelos bem longos, mais negros que a noite, de andar tão macio que nem as areias conseguem gravar os seus pés delicados. 
      A seguir suspirou profundamente e partiu. 
     
      
       
     
  
       

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