quinta-feira, 13 de setembro de 2012

ENVELHECER

 

Tudo é muito de repente,
Uma doença se instala,
Limita a vida da gente,
A forte voz quase cala,
Aumentam o grau da lente,
Nos sugerem uma bengala,
Nos chamam de paciente,
E nos transformam num “mala”.
 
“Mala”, desses sem alça,
Que só fala do passado,
Pra quem o tempero é salsa
Não um ritmo dançado,
Porque só conhece a valsa.
Que além de ultrapassado
Faz até xixi na calça,
E ainda vive barbado.
 
Nessa hora o “bicho” pega,
A ilusão pra vir demora,
E praticamente cega,
A visão do nosso agora.
O que foi bom vira bodega,
A esperança vai-se embora,
E a gente quase se entrega,
À mágoa que nos devora.
 
II
                                  Cabelos brancos, mais ralos,                                    
Olhos fundos, falta brilho,
Pele mais fina e sem calos,
O neto que vira filho,
O filho que vira pai,
A ilusão que se esvai,
A esperança passa longe
E o horizonte se esconde.
 
O tudo passa a ser nada,
O futuro é no presente,
Presente é coisa passada,
Olham com dó para a gente,
A saudade é mais malvada,
Sofrimento é impertinente,
O tempo é festa acabada,
E alegria é aparente.
 
Mesmo assim a gente agüenta,
Até quando Deus quiser,
Setenta oitenta ou noventa,
Até mais, caso vier,
E o coração não arrebenta,
Se ainda tiver mulher,
Senão! É grande a tormenta,
Pra ir aonde não quer.
 

  III

 
Quando se fica sozinho,
Nos estertores da vida,
Sem amor e sem carinho,
É como a ave perdida,
Que não mais encontra o ninho.
Mas, já no fim da corrida,
Aos poucos, devagarzinho,
Se, entrega à hora doída.
 
Mais nada vendo na frente,
Nem sequer, mesmo, ao seu lado,
Difícil é ficar contente.
Pois, se for resignado,
Deixar de ser combatente,
Não há significado,
Portanto, ao ser persistente,
Resiste como um soldado.
 
Soldado que está na guerra,
Mas não por sua opção,
Que nas trincheiras da terra,
É sobra de um pelotão,
Que com seu fim se encerra.
Por isso, como um leão,
Tudo enfrenta e até se ferra,
Pra não deitar no caixão.
 
     IV
Porém, logo se acostuma,
Com tamanha confusão,
Pois quem não tem mais nenhuma,
Também não tem opção.
A lente de grau mais forte,
Aproxima os objetos,
A bengala aponta o norte
E é arma contra os espertos.
 
O passado é só saudade,
O futuro não interessa,
Não se faz conta da idade,
Pois tudo acaba depressa.
Portanto se salsa é dança,
Ou tempero de comida,
No tempo que sempre avança,
Nada muda em minha vida.
 
Preciso somar agoras,
De alegria e de prazer;
Preciso fazer as horas,
Enormes no meu viver;
Não deixar de ver nas cores,
O verde da esperança;
Não esquecer dos amores,
Nem deixar de ser criança.
 
V
Assim, estou consciente,
Que só novo fica velho,
Se já fui adolescente,
Nos meus erros me espelho.
Portanto a experiência,
Arduamente adquirida,
Doou-me a tal paciência,
E o conhecer dessa vida.
 
Então a hora do fim,
Eu não quero nem saber,
Quando ela chegar a mim,
Sequer irei perceber.
Estarei tão distraído,
Em meio a tanta beleza,
Que feliz terei partido,
No colo da natureza.
 
Bem simples é a passagem,
Que pela terra fazemos,
Mesmo assim, com esta viajem,
Não quer dizer que morremos.
Tudo que no mundo existe,
Transforma-se dia a dia,
Portanto a gente persiste,
Transformado em nostalgia.
 

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