Na caixa de papelão, dois olhos
brilhavam,
Entre os jornais, um corpo
pequeno, aquecido,
Os pés, só as sujeiras do ontem
guardavam,
Unhas longas mostravam o tempo
perdido.
Em seus lábios, a sede e a fome
aumentavam,
No rosto o semblante de alguém já
sofrido,
Gravado nas marcas que, as faces
exibiam,
E em nós, só a certeza de alguém
esquecido,
É na fonte da praça onde lava o
seu rosto
Escova seus dentes apenas com os
dedos,
Que esboça um sorriso e se mostra
disposto.
Com a mente vazia da noite e seus
medos.
Percorre as calçadas e rumina
desgostos,
Levando nos bolsos esperança e
segredos,
Enquanto na alma, da ilusão, faz
encostos,
Pra descanso da fé, já com seus
arremedos.
No peito, fechado, um coração em
frangalhos,
Em seus atos as nódoas de um céu
de abandono,
Vivendo a ilusão, só encontrada em
atalhos,
Com a mão estendida, pedindo o
abono
De moedas que nutrem seus sonhos
paspalhos,
E poder ser criança, sentando em
seu trono,
Ser um rei sem poder, mas não ser
espantalho.
Eu não posso entender que esta
cena repita,
Em todos instantes e em tantos
lugares.
Quem somos meu Deus, uma praga
maldita?
Quem sabe! Só homens desnudos de
amor?
Sejamos humanos e ao ver mão
aflita,
Doemos a nossa com todo o pudor.
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